Anistia a golpistas: o perigo de repetir erros da História

TRANSCRIÇÃO DO PODCAST

A democracia brasileira já enfrentou 17 tentativas de golpe desde 1889, mas aqui está algo surpreendente: em quase metade dos casos, os golpistas foram perdoados e tentaram novamente. Este é o tema do episódio de hoje de Relatos – A Estação da História.

Humm… isso é realmente preocupante, especialmente considerando o projeto de lei 2858, que propõe anistiar os envolvidos nos atos de janeiro de 2023.

E sabe o que torna isso ainda mais assustador? Temos um caso histórico que ilustra perfeitamente esse ciclo vicioso. Em 1956, o major-aviador Haroldo Veloso liderou a Revolta de Jacareacanga contra Juscelino Kubitschek, foi perdoado, e — você não vai acreditar — tentou outro golpe apenas três anos depois.

Nossa, então ele realmente interpretou a anistia como um sinal verde para continuar conspirando! O que aconteceu na segunda tentativa?

Bem, na Revolta de Aragarças, ele e seus comparsas foram muito mais ousados. Imagine só: sequestraram aviões militares e civis, fizeram reféns, e planejavam bombardear instalações do governo. O objetivo era bem claro: obter o apoio da UDN, o partido da direita na época, e instaurar uma ditadura militar.

E como JK lidou com essa segunda tentativa, considerando que já tinha dado um perdão antes?

Dessa vez ele foi mais firme e negou a anistia. Mas aqui está a parte mais surpreendente — os golpistas, que se refugiaram no exterior, acabaram voltando ao país durante o governo Jânio Quadros, beneficiados por outro perdão político. E um deles se tornou uma figura central da repressão durante a ditadura.

Você está falando do tenente-coronel João Paulo Burnier, não é? Li que ele se envolveu em algo ainda mais sinistro depois.

Exatamente! Em 1968, já como brigadeiro, Burnier arquitetou o Caso Para-Sar, um plano absolutamente aterrorizante. Ele e seus comparsas pretendiam detonar explosivos em pontos estratégicos do Rio de Janeiro, incluindo o gasômetro de São Cristóvão, o que poderia causar uma tragédia sem precedentes.

E qual era o objetivo final desse plano tão destrutivo?

Olha só que diabólico – eles queriam criar um clima de caos total, culpar a esquerda pelos atentados, e depois usar a confusão para executar a fase mais sombria: o “voo da morte”. Quarenta políticos importantes, incluindo Carlos Lacerda, Jânio Quadros e até JK, seriam sequestrados e jogados ao mar.

Meu Deus… e como esse plano foi descoberto?

Foi graças à coragem do capitão Sérgio Miranda, que denunciou tudo, mesmo sabendo que sofreria graves consequências. E sofreu — passou anos sendo perseguido e prejudicado na carreira militar.

E pensando no presente, como podemos relacionar esses eventos históricos com a atual proposta de anistia?

É um paralelo assustador. O projeto atual não só quer perdoar o vandalismo contra as sedes dos Três Poderes, mas também pode beneficiar pessoas envolvidas em conspirações muito mais graves, incluindo planos de assassinato de autoridades.

E tem a questão constitucional também, não é? A Constituição determina que ações de grupos civis ou militares contra a ordem democrática são crimes que não prescrevem e não podem ser objeto de fiança.

Exato. É como se estivéssemos dizendo que esse dispositivo constitucional é apenas uma sugestão. E a história nos mostra que essa flexibilização sempre teve um preço alto — após as anistias de Jacareacanga e Aragarças, muitos dos beneficiados ajudaram a construir o golpe de 1964.

Então existe um padrão histórico claro de reincidência após anistias?

Sem dúvida. E mais que isso — cada anistia parece encorajar tentativas mais ousadas e violentas. É como se cada perdão fosse interpretado como uma autorização para ir mais longe da próxima vez.

Como podemos quebrar esse ciclo vicioso?

Bem, o primeiro passo é reconhecer que perdão sem arrependimento não é reconciliação — é cumplicidade. Precisamos entender que, algumas vezes, defender a democracia significa ter firmeza e fazer valer as leis.

Essa discussão realmente nos faz refletir sobre o verdadeiro significado de justiça e reconciliação nacional.

E talvez seja hora de aprendermos que o amor à democracia exige dizer não à impunidade. Porque, no final, não estamos apenas decidindo sobre um perdão judicial — estamos escolhendo que tipo de futuro queremos para nosso país.

Entre em relatos.blog.br e deixe seu comentário. Se gostou do conteúdo, compartilhe com seus amigos. Texto, roteiro e edição de áudio: Djalba Lima.

djalba.lima@gmail.com Escrito por:

8 Comentários

  1. Isabela
    abril 22, 2025
    Responder

    Texto perfeito, Djalba! Espero que não caiam nesse erro, porque as consequências certamente virão.

  2. marly Vieira Paiva
    abril 24, 2025
    Responder

    Excelente e mais que oportuno. Um artigo necessário para evitar que os golpes continuem a se repetir. A Constituição tem de ser respeitada.

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