Por DJALBA LIMA (*)
“Temos ódio à ditadura. Ódio e nojo. Amaldiçoamos a tirania onde quer que ela desgrace homens e nações.” – Ulysses Guimarães.
As palavras de Ulysses Guimarães, pronunciadas em 5 de outubro de 1988, na promulgação da Constituição Cidadã, ecoam como um grito atravessando décadas. Era a celebração do fim da noite autoritária e a promessa de que, dali em diante, nunca mais o Brasil se curvaria ao arbítrio.
Hoje, no entanto, é o próprio Congresso Nacional que ameaça a herança de Ulysses. Ao avançar com a chamada PEC da Blindagem e a anistia a golpistas, a casa que deveria proteger a democracia parece disposta a mutilar o texto que nasceu da luta contra a ditadura. Não é sem razão que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil lançou a pergunta incômoda:
“Diante das propostas que ameaçam a transparência e fortalecem a impunidade devemos nos questionar: quem protegerá a sociedade brasileira das incongruências do próprio Congresso Nacional? A resposta vem da ideia de que a democracia se fortalece quando a sociedade participa, fiscaliza e exige responsabilidade de seus representantes.”
A Constituição em xeque
A Constituição de 1988 foi construída como pacto de reconciliação nacional, mas também como muralha de proteção das liberdades civis. Ulysses advertiu naquele dia:
“A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa, ao admitir a reforma. Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca. Traidor da Constituição é traidor da pátria.”
É exatamente esse ponto que nos atinge agora: quando o próprio Congresso decide trair a Constituição, quem terá legitimidade para freá-lo?
Depois das ruas
O domingo, 21 de setembro de 2025, marcou uma reação popular significativa. Milhares de brasileiros saíram às ruas em várias capitais para dizer não à anistia a golpistas e não à PEC da Blindagem. O recado foi claro: a cidadania não aceitará ser silenciada.
Agora, a bola está no campo do Congresso. Ignorar o grito das ruas seria não apenas um erro político, mas um atentado direto à própria legitimidade da instituição. Afinal, se os representantes viram as costas ao povo, a quem de fato representam?
A encruzilhada
Ulysses dizia que “a persistência da Constituição é a sobrevivência da democracia”. O que está em jogo agora é a fidelidade a esse juramento. A PEC da Blindagem não é apenas uma emenda técnica: é um retrocesso histórico, um aceno à impunidade e uma negação ao pacto de 1988. O mesmo se pode dizer dessa proposta esdrúxula de anistia para golpistas, que alimenta futuras tentativas de destruição da democracia.
As manifestações já deixaram claro que o povo não se calará. Resta saber se os parlamentares terão a coragem de ouvir o povo e honrar a Constituição que juraram defender – ou se optarão pela covardia de legislar em causa própria.
(*) DJALBA LIMA é jornalista,

seja o primeiro a comentar