Como a extrema direita usa o discurso anticorrupção para atacar a democracia

Samara Bem-vindo a Relatos – A Estação da História. Neste episódio, vamos analisar o avanço da extrema direita sob a perspectiva do combate à corrupção de Estado.

Djalba O combate à corrupção como arma política? Parece nobre, não é? Mas a história nos mostra um padrão perturbador onde esse discurso foi usado para destruir democracias ao invés de fortalecê-las.

Samara – Isso me faz lembrar daquela frase atribuída ao filósofo italiano Norberto Bobbio que viralizou nas redes sociais. A que fala sobre como os fascistas usam o suposto combate à corrupção como escudo para suas maldades. A frase é: “O fascista fala o tempo todo em corrupção. Fez isso na Itália em 1922, na Alemanha em 1933, no Brasil em 1964. Ele acusa, insulta, agride, como se fosse puro e honesto. Mas o fascista é apenas um criminoso comum, um sociopata que faz carreira na política.”

Djalba Olha só que interessante: fizemos uma pesquisa minuciosa e não encontramos essa citação em nenhuma obra dele. Mas sabe o que é mais fascinante? Mesmo sem confirmação de autoria, ela captura perfeitamente um padrão histórico que se repete.

Samara – Então vamos explorar esse padrão. Como ele começou na Itália de 1922?

Djalba – Bem, Mussolini foi um mestre nesse discurso manipulador. Ele construiu toda sua narrativa em torno da ordem e da moralidade, pintando os parlamentares como corruptos e o sistema liberal como decadente. E olha só – estudos mostram que cerca de 67% dos italianos na época acreditavam que o sistema parlamentar estava completamente corrompido.

Samara Nossa, e o que aconteceu depois que ele assumiu o poder foi COMPLETAMENTE o oposto do que prometeu, não foi?

Djalba – Uh, totalmente. Em menos de dois anos, ele estabeleceu uma ditadura que não só censurava e perseguia opositores, mas que abrigava um sistema de corrupção institucionalizada. Os registros históricos mostram que o regime fascista desviou aproximadamente 30% do orçamento nacional para contas secretas.

Samara – E na Alemanha, Hitler seguiu praticamente o mesmo roteiro, mas elevou tudo a um nível ainda mais sinistro.

Djalba – Você sabe que em 1932, antes de Hitler chegar ao poder, cerca de 84% dos alemães diziam que a corrupção era seu principal problema? Hitler explorou isso de forma magistral, prometendo uma “limpeza moral” do país. Mas quando assumiu, transformou essa narrativa em algo muito sinistro. Em pouco tempo, prendeu e matou comunistas, ciganos, judeus, dissidentes. O suposto combate à corrupção virou pretexto para o terror institucionalizado.

Samara – Hum… e aqui no Brasil, em 1964, vimos uma adaptação tropical desse mesmo roteiro, não é?

Djalba – Exato, e os números são reveladores. Durante os 21 anos de ditadura militar, que supostamente veio para combater a corrupção, o país caiu 45 posições nos índices internacionais de transparência. E mais: documentos desclassificados mostram que os desvios de recursos públicos aumentaram em cerca de 300%.

Samara – Mas por que você acha que esse discurso anticorrupção é tão eficaz como ferramenta política?

Djalba – Porque é simples. Porque apela à raiva. Porque cria um inimigo comum. E porque a corrupção, infelizmente, é real. E se governos democráticos não lidam com ela com firmeza e transparência, abrem espaço para que a extrema direita ocupe esse vácuo com populismo punitivista e autoritarismo disfarçado.

Além disso, estudos em psicologia política mostram que mensagens sobre corrupção ativam áreas do cérebro ligadas à raiva e ao medo. E quando as pessoas estão com medo e raiva, elas tendem a aceitar soluções mais radicais. Os dados mostram que muitas pessoas estão dispostas a apoiar medidas autoritárias se acreditarem que isso vai acabar com a corrupção.

Samara – E como podemos proteger nossas democracias desse tipo de manipulação?

Djalba – Olha, especialistas em ciência política apontam cinco pilares fundamentais. Primeiro, transparência total – países com alto índice de transparência têm 60% menos chances de cair em autoritarismo. Segundo, instituições fortes e independentes. Terceiro, educação cívica desde cedo. Quarto, combate à desinformação. E quinto, participação popular ativa.

Samara – E você sabe que os dados mais recentes mostram que países com maior participação cidadã têm índices de corrupção 40% menores?

Djalba – Sim, e isso nos leva a uma conclusão importante: o verdadeiro combate à corrupção fortalece a democracia, não a destrói. Quando vemos alguém usando esse discurso para atacar instituições democráticas, precisamos estar atentos.

Samara – Então o que devemos observar para identificar quando o discurso anticorrupção está sendo usado de forma manipuladora?

Djalba – São três sinais. Primeiro, observe se o discurso mira mais pessoas específicas do que sistemas. Dois, fique atento quando prometem soluções rápidas e simplistas. E três – talvez o mais importante – quando o combate à corrupção vem acompanhado de ataques às instituições democráticas; isso é um sinal vermelho.

Samara – Parece que a história está sempre nos ensinando as mesmas lições, não é?

Djalba – É verdade. E lembre-se: esquecer é permitir que o engodo se repita. O mais importante é ter em mente que democracias fortes não são construídas com gritos de ordem, mas com instituições sólidas e participação cidadã consciente.

Samara – Este foi mais um episódio de Relatos – A Estação da História. Onde o passado nunca é só passado. Texto e roteiro: Djalba Lima

djalba.lima@gmail.com Escrito por:

seja o primeiro a comentar

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *